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Nesta entrevista temos o viajante Rui Munhoz.
Vamos conhecer um pouco mais sobre quem viaja e explora o mundo. Nesta rubrica “QUEM VIAJA“, proponho dar a descobrir várias pessoas que viajam o mundo à sua maneira, cada um de forma diferente. Tento criar assim, um perfil de viajante, rápido e fácil de ler sobre vários viajantes portugueses e brasileiros.
Rui Munhoz – Perfil de Viajante
- Nome completo: Rui Neves Munhoz
- Profissão: Sector público
- Data de nascimento: 1961
- Local de nascimento: Vila Real de Santo António – Portugal
- Local de residência: Coimbra / Cantanhede / Figueira da Foz – Portugal
- Quantos países já visitou: 45
- Quantos continentes já visitou: Falta-me a Oceânia, mas lá chegarei, um dia, se a tal me ajudar o engenho e a arte e o vil metal também
- Maneira preferida de viajar: comboio
- Comida preferida: Toda a gastronomia Portuguesa
- Cor preferida: Azul do céu e do mar
- Banda preferida: Dead Can Dance, U2 e Muse
- Fruta preferida: Todas as frutas Portuguesas
- Livro de viagem preferido: Disse-me um Adivinho, de Tiziano Terzani. Fabuloso; é a forma como eu sinto, entendo e vivo, cada viagem
- Já se apaixonou por alguém em viagem? Apaixono-me por muitas pessoas e por muitos lugares, em muitos momentos e em muitas viagens. Sou um coração volúvel. Essas paixões são eternas enquanto duram, depois ficam as memórias
- Você vive para viajar ou viaja para viver? Vivo e trabalho, para poder viajar e, por essa soma de razões; viajo para viver. Só me sinto vivo enquanto viajo, quando leio e sempre que escrevo. Se um dia não puder viajar ou ler ou escrever; a minha vida deixará de ter sentido e, então, já não merecerei viver
- Próximas viagens: Uzbequistão, Birmânia e Etiópia
- Países onde não voltaria: Regressarei sempre, a todos os lugares que já vi, senti e vivi, em corpo ou em espírito
- Países onde voltaria: Sempre à Índia, ao Irão e à Turquia. E a tantos outros também
- Países com melhor comida: Portugal, Vietname e Turquia
- Qual o país com mulheres / homens mais bonitos: Jordânia e Irão
- Hotel preferido: A casa de Maziyar Ale Davood, na aldeia de Garmeth, junto a um oásis no deserto de Dashte – Kavir, no centro do Irão. O Maziyar e a família, recebem-nos em casa, de braços abertos. Uma vivencia inesquecível, aqueles dias em Garmeth
- Site / blog: http://ruimunhoz.wordpress.com
Rui Munhoz – Rubrica: Quem viaja – Falar com o viajante
Fotografia Viagem de Rui Munhoz
Qual é a sua relação com as viagens? O que pretende encontrar enquanto está a conhecer outros países?
Comecei a viajar muitos anos antes de nascer, nos genes familiares já estava tão delicioso vicio. Viajo por vocação, por devoção e por educação. Sei apenas que sem viajar não sou feliz. Se a felicidade existe, ela está, para mim, na partida e na descoberta de novas e diferentes formas de vida, na aprendizagem continua, para que eu possa ser um pouco melhor em cada dia que passa. Talvez menos egoísta, talvez mais tolerante e solidário. Hoje, com mais de meio século de vida, ainda não sei bem se viajo para encontrar os outros, ou para me encontrar a mim mesmo. Pois a grande viagem das nossas vidas é aquela que fazemos à volta de nós próprios. Como alguém já escreveu: ‘’…Antes de chegar, já lá estou e, depois de regressar, ainda lá fico…’’.
Tenho uma relação descomplexada com as viagens; parto com pouca bagagem, de espírito limpo e com o coração puro, pleno de vontade de conhecer e aprender. Regresso sempre muito mais rico. Viajar não é uma mera soma aritmética de sinais exteriores, é antes uma soma de vivências e afectos, pelas coisas do mundo e dos homens. É um contínuo aprender, é ver mais longe, mais além, é tornarmo-nos melhores. Viajo não só para conhecer os outros, mas também para me conhecer a mim mesmo.
Gosto de partilhar conversas em cafés e perder-me em praças e largos, assim aprendo muito mais do que encerrado em museus; aprendo a viver melhor.
Muitos viajantes ficam fortemente marcados por algumas viagens, certas pessoas, culturas diferentes e experiências especiais. Qual a viagem mais marcante para si e conte o porquê:
A Índia e o Irão foram os meus primeiros sonhos infantis de viagens. Consegui ir à Índia, pela primeira vez, em 1992. A partir dessa data, já tive a oportunidade de regressar várias vezes e, sinto sempre que algo de especial me liga à Índia. Sinto que é um regresso a casa, onde terei vivido numa outra vida. Não gosto de comparar lugares, regiões, países ou pessoas, mas entendo a índia como o mais fabuloso pais do planeta; é lá que eu sinto o que é uma multidão, o que são cores fortes, cheiros intensos, miséria e luxo, história e futuro, dignidade e crueldade, esperança e solidariedade. Na Índia encontro uma humanidade que sente e sofre, mas alegre e que celebra a vida. Acredito que não se pode contar a Índia, porque as palavras são escassas; é necessário senti-la. Nenhum de nós consegue ser indiferente à Índia, apenas podemos amá-la ou odiá-la, não há meio-termo.
Quanto ao Irão, a paixão também é antiga: lembro-me da celebração dos 2.500 anos do império Persa, em Persépolis, acontecida no ano de 1971, tinha eu 10 anos. Então, resolvi que haveria, um dia, de ir ao Irão. Apenas lá cheguei em 2011 e encontrei o povo mais afectuoso, amistoso, inteligente e culto, que já conheci. Regressarei certamente, um dia, mas parte do meu espírito já lá ficou. Por estas razões e muitas outras, a Índia e o Irão, são duas paixões na minha vida.
Algumas pessoas precisam de ser incentivadas a sair de casa, a perder o medo de viajar. Que conselhos pode dar a alguém que quer começar a viajar mas não sabe como, quando e porquê?
Apenas posso dizer, que todos temos momentos de receio, temores e dúvidas; descobrir um caminho, passa apenas por nós e o que parece difícil hoje, pode ser fácil amanhã. Tudo é uma questão de atitude, porque tudo na vida tem um início. Para que alguém se sinta mais seguro e confiante para viajar, nada melhor do que partilhar com um familiar, ou amigo, a experiência de uma viagem curta, acessível e interessante. Então, com o correr dos dias, ruirão as muralhas de medos e fobias. Muito mais importante do que guias teóricos, são as vivências e a partilhas mútuas de experiências de vida. Viajar é como ler; ‘’…primeiro estranha-se, depois entranha-se…’’. Muitas vezes, os maiores riscos, corremo-los no nosso próprio país.
Já viveu num país diferente mais do que seis meses? Se sim, onde foi e o que esteve a fazer. Diga-me também, o que retirou dessa sua experiência de viver no estrangeiro:
Nunca vivi tanto tempo fora de Portugal, mas gostava muito de o poder fazer e, sei que o conseguirei, um dia. Restam-me cortar algumas amarras à minha zona de conforto, libertar-me de egoísmos efémeros e, partir sem rumos e percursos, demasiado definidos. Concedendo-me a liberdade plena de decidir, em cada momento, o que desejo fazer, conhecer e aprender.
Nunca passei mais do que um mês seguido, fora de Portugal. Tive já a oportunidade de o poder fazer por diversas vezes e a boa sorte de poder percorrer algumas regiões, por períodos de um escasso mês: Índia; China; Vietname; América do Sul (Colômbia, Peru e Bolívia); África Oriental (Quénia, Tanzânia, litoral do Indico e Zanzibar); Turquia; Médio Oriente (Síria, Jordânia e Palestina).
Aprendi e continuo a aprender sempre: ser solidário e tolerante. Acreditar que apesar de todos diferentes somos todos iguais. Acreditar que as diferentes religiões e culturas, são factor de união, nunca de separação. Partir sem ideias feitas. Apagar os preconceitos. Lembrar-me, em cada dia que passa, que por muito que pense aprender, nada sei. Continuar a acreditar que o homem é o centro do universo e que a sua dignidade é uma missão que todos temos o dever de cumprir, em todas as nossas atitudes e gestos.
Escolher uma paisagem preferida pode ser muito difícil. Mas tente escolher uma paisagem que ficou para sempre na memória. O que sentiu naquela altura?
É difícil escolher uma única paisagem, mas escrevo aqui, sem alguma dúvida, que o Salar de Uyuni, no Sudoeste da Bolívia, entre Oruro e Potosi, mudou a minha vida. Vi a ‘’mãe natureza’’ em toda a sua força e esplendor e soube que o homem, só cumpre o seu destino, se salvaguardar e respeitar este planeta, cada vez menos azul e cada vez mais cinzento, para o poder transmitir a gerações futuras. Porque só há uma terra. Senti-me feliz por os meus já cansados olhos poderem ver e sentir tão desmesurada beleza. Senti-me minúsculo e, em simultâneo, um deus à escala humana.
Se pudesse escrever aqui sobre outras paisagens, que ainda sinto na pele, então escolheria também o vale do Rift Africano, com os lagos e vulcões; a savana com cheiro a terra molhada, coberta por um céu protector, no Quénia e Tanzânia; a floresta Amazónica, húmida e luxuriante, plena de vida, em Iquitos; a infinidade fascinante do deserto do Saara; a baia de Ha Long; os Andes; os Himalaias; os campos pintados de lavanda e alfazema na Provence; e tantas outras paisagens perdidas e encontradas, por esse vasto mundo.